quarta-feira, 19 de maio de 2010

MINHA CASA NO CHILE SE TRANSFORMOU NUM MONUMENTO NACIONAL

Quando se perpetrou o golpe militar contra Salvador Allende, comandado pelo General Pinochett, meu nome estava na primeira lista de perigosos inimigos emitida pelo governo golpista, entre os principais dirigentes da Unidade Popular. Eu e José Maria Rabelo éramos os únicos estrangeiros incluídos nesta lista equivalente ao Ato Constitucional número 1, emitido pela ditadura brasileira que tão diretamente auxiliou o golpe chileno. Diante da gravidade desta situação, meus companheiros do Partido Socialista Chileno providenciaram um local para que me escondesse até que se esclarecesse o resultado final do golpe. Por esta razão só fui exilar-me uma semana depois do golpe, tendo como último refugio possível, a embaixada do Panamá, um pequeno apartamento de 100 metros quadrados, sem maior vigilância policial. Devido estas circunstâncias este apartamento atraiu mais de 300 refugiados em poucos dias. Diante da situação insustentável de 3,5 pessoas por metro quadrado, terminei emprestando minha casa recém comprada e ainda não habitada, situada na Rua Diego Cañas, para converter-se numa extensão da embaixada do Panamá. Dito e feito, o embaixador conseguiu o translado do pessoal exilado para a minha casa. Deles, em poucos dias quase todos receberam seu visto para ir-se ao Panamá, em aviões fretados pelo governo de Torrijos, o general progressista que recuperou para seu povo o Canal do Panamá. Contudo o governo militar interditou a saída de 9 exilados que aí ficamos por 4 meses tentando sair, enquanto novos exilados saltavam os muros
da casa buscando o exílio.Algum dia contarei esta história em detalhes apesar de que já houve varias versões da mesma em que eu apareço sempre como alugando a casa à embaixada. Não é verdade: eu simplesmente emprestei a casa e não recebi um centavo pela mesma. Talvez esta idéia se baseia em notícias que apareceram na imprensa panamenha referindo-se ao pagamento de mais de 20 mil dólares pelo casa alugada pela embaixada.

Mas nada disto explica a encampação desta casa pelo governo chileno depois de um amplo movimento social. Ocorre que depois de que saímos os 9 "diferidos" para o exterior e o embaixador teria oficialmente devolvido a mesma, o governo militar a expropriou e a converteu num dos principais centros de tortura da DINA. Com a queda da ditadura, gerou-se um grande movimento pela sua transformação num monumento público contra a ditadura.
Recebi, depois de alguns anos mais, a casa de volta e tentei, sob a pressão de várias cartas dos pais dos companheiros nela mortos ou torturados, troca-la por outro local mas o governo do Chile foi insensível naquele então à demanda do movimento cívico. Vendi-a a uma empresa vizinha, a qual pretendia transforma-la num importante edifício. Mas a pressão só aumentou.
A empresa derrubou então a casa para desestimular o movimento. Contudo ele continuou até que o governo assumiu o local, oferecendo um outro local à empresa. Dessa forma, a "casa do Theotonio", como era chamada, se transformou no memorial nacional da Fundação Domingos Caña que o leitor pode acessar no seguinte link:


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